A coincidência talvez seja bem mais que coincidência. No mesmo dia em que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, divulgava a lista de autoridades e políticos que serão investigados no âmbito da Operação Lava-Jato, o presidente Michel Temer (PMDB) se reuniu com lideranças partidárias, da área econômica do governo e com o relator da PEC 287 para buscar um modo de votar e aprovar as mudanças nas regras da Previdência Social no Brasil.
A lista do ministro do Supremo coloca perto de um terço dos ministros de Temer – oito dos 28 titulares – na condição de investigados por suposta participação em casos de corrupção envolvendo empreiteiras, outras empresas e compra de apoio em licitações e na aprovação de projetos no Congresso Nacional. Ela é decorrente das delações da empreiteira Odebrecht. Estão ainda na lista os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Os presidentes nacionais do PSDB, Aécio Neves, e do PMDB, Romero Jucá, também serão investigados. O PSDB talvez seja, ao lado do DEM, o partido mais coeso na defesa das ‘reformas’ de Temer que reduzem direitos trabalhistas e previdenciários. Há ao todo 71 parlamentares no rol dos investigados, de partidos da base aliada (PSDB, PMDB, DEM, PSD, PPS, PP, PR, SD, PSB e PRB, entre outros) e da base do governo antecessor que hoje atua como oposição (PT e PCdoB) – ver lista ao final do texto.
Calendário
Com dificuldades para aprovar a reforma da Previdência Social, Temer negocia com a base aliada no Congresso Nacional possíveis alterações no texto. Quebradas todas as otimistas previsões dos aliados do Planalto de datas para as votações, tenta colocá-lo em pauta antes do recesso parlamentar, em julho: na comissão especial, até o final de abril, e no Plenário da Câmara, ainda na primeira quinze de maio. Não nutre mais esperanças nem prazos para votá-lo também no Senado Federal no primeiro semestre, como reiteradas vezes cogitou.
A máquina estatal vem sendo usada para ‘vender’ a reforma. Com a decisão da presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, de derrubar as liminares que proibiam a propaganda do governo a favor da proposta, o Palácio do Planalto foi além e veiculou peças publicitárias que miram o servidor público – outra vez apontado como privilegiado e responsável pelos supostos ‘rombos’ no sistema. A ministra alegou que a não vinculação das propagandas – escancaradamente favoráveis ao projeto oficial – significaria “risco de grave lesão à ordem pública administrativa”.
Relator
Logo após a reunião que tentou costurar um acordo na base aliada, o relator da proposta na comissão especial, deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), chamou jornalistas para fazer um pronunciamento. Tentou expressar otimismo, que contrastava com o clima daquela noite. “Hoje já podemos apresentar aos líderes um esboço daquilo que será o nosso projeto, o nosso relatório que será apresentado na semana que vem. Todos os líderes que estiveram presentes na reunião nos autorizaram a dizer que diante das alterações que foram finalizadas eles encaminharão nas suas respectivas bancadas a favor da aprovação de nosso relatório”, disse.
Naquela mesma noite, um programa de debate ao vivo que iria ao ar na TV Câmara, às 21 horas, foi cancelado porque apenas a auditora fiscal Maria Lúcia Fattorelli, da Auditoria Cidadã da Dívida e militante da luta contra a PEC 287, compareceu. Os dois deputados convidados que integram a comissão especial que analisa a PEC –Carlos Marun (PMDB-MS), presidente desse colegiado, e Pepe Vargas (PT-RS), simplesmente não compareceram.
Impopular desde o início, Temer vê a aprovação ao seu governo cair continuamente. Também ele citado nas delações da Odebrechet, mas salvo por um entendimento controverso da Procuradoria-Geral da República, de nem sequer investigá-lo por conta dos atos citados se referirem a período anterior ao cargo, parece se agarrar nas reformas para manter o apoio dos setores empresariais.
Greve geral
É com oito ministros e 71 parlamentares sob investigação, incluindo os presidentes das duas casas legislativas, que o presidente peemedebista quer aprovar as ‘reformas’ previdenciária e trabalhista, capazes de provocar a maior mudança em termos de direitos sociais e laborais na vida dos trabalhadores pelo menos desde a Constituição de 1988. O governo não está parado e tenta construir as condições para isso. Sabe que, hoje, não tem como aprovar a PEC 287. Sugere alterações em alguns pontos para tentar criar um cenário de negociação e acordo na base parlamentar.
Os movimentos contrários à proposta se colocam majoritariamente, ao menos até aqui, contra as negociações pontuais: querem derrubar todo o projeto. A convocação da greve geral para o dia 28 de abril, por nove centrais sindicais, pode ser um marco na luta contra as reformas e um demarcador do tamanho da rejeição ao governo. A data foi referendada na reunião ampliada da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e MPU (Fenajufe), quando os servidores decidiram indicar a construção nacional da greve geral contra a retirada de direitos.
Veja a lista de todos os investigados divulgada pelo STF
MINISTROS
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), Relações Exteriores
Blairo Maggi (PP), Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Bruno Araújo (PSDB), Cidades
Eliseu Padilha (PMDB), Casa Civil
Gilberto Kassab (PSD), Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Helder Barbalho (PMDB), Integração Nacional
Marcos Pereira (PRB), Indústria, Comércio Exterior e Serviços
Moreira Franco (PMDB), Secretaria-Geral da Presidência da República
SENADORES
PCdoB
Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM)
PMDB
Eunício Oliveira, presidente do Senado (PMDB-CE)
Renan Calheiros (PMDB-AL)
Romero Jucá (PMDB-RR)
Edison Lobão (PMDB-MA)
Kátia Abreu (PMDB-TO)
Eduardo Braga (PMDB-AM)
Valdir Raupp (PMDB-RO)
PP
Ciro Nogueira (PP-PI)
Ivo Cassol (PP-RO)
PSB
Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE)
Lidice da Mata (PSB-BA)
PSD
Omar Aziz (PSD-AM)
PSDB
Aécio Neves (PSDB-MG)
Antonio Anastasia (PSDB-MG)
Cássio Cunha Lima (PSDB-PB)
Dalirio Beber (PSDB-SC)
José Serra (PSDB-SP)
Ricardo Ferraço (PSDB-ES)
PT
Paulo Rocha (PT-PA)
Humberto Costa (PT-PE)
Jorge Viana (PT-AC)
Lindbergh Farias (PT-RJ)
PTC
Fernando Collor de Mello (PTC-AL)
DEPUTADOS
DEM
Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara
José Carlos Aleluia (DEM-BA)
Onyx Lorenzoni (DEM-RS)
Rodrigo Garcia (DEM-SP)
PCdoB
Daniel Almeida (PCdoB-BA)
PMDB
Pedro Paulo (PMDB-RJ)
Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA)
Daniel Vilela (PMDB-GO)
PP
Mário Negromonte Jr. (PP-BA)
Paulo Henrique Lustosa (PP-CE)
Cacá Leão (PP-BA)
Dimas Fabiano Toledo (PP-MG)
Júlio Lopes (PP-RJ)
PPS
Arthur Oliveira Maia (PPS-BA)
PR
João Carlos Bacelar (PR-BA)
Milton Monti (PR-SP)
Alfredo Nascimento (PR-AM)
PRB
Celso Russomano (PRB-SP)
Beto Mansur (PRB-SP)