2/9/2011


ORÇAMENTO

Reação faz Dilma rever projeto, mas mantém oposição a reajuste e luta pelo PCS se acirra

Reação do STF e recuo do governo na LOA, como defendiam servidores, expõe disputa em curso e dão à mobilização da categoria papel ainda mais decisivo


 A crise desencadeada pela exclusão da previsão orçamentária para os reajustes do Judiciário Federal e MPU levou o governo a recuar e encaminhar ao Congresso Nacional, na tarde desta quinta-feira (2), adendo à proposta incluindo os valores que foram retirados pelo Planalto. A reação do STF em defesa da autonomia do Poder Judiciário e a reviravolta no caso foram uma vitória dos servidores, mas abre-se agora uma nova etapa na luta pelo PCS, tão ou mais difícil quanto as demais. Nesta nova fase, o principal desafio será garantir a aprovação dos projetos na Comissão de Finanças (PL 6613/2009 e PL 6697/2009) e impedir que haja cortes na proposta de orçamento – a participação dos servidores nas mobilizações é apontada agora por dirigentes sindicais como mais decisiva do que nunca nessa disputa.

Acompanha a mensagem de adendo à Lei Orçamentária Anual para 2012 (LOA) encaminhada pelo Ministério do Planejamento ao Congresso, porém, uma série de ressalvas da presidenta Dilma Rousseff contrárias aos reajustes, nas quais ela tenta justificar por que os valores não estavam incluídos no projeto inicial. “As propostas que ora remeto não foram incluídas na peça Orçamentária de 2012, em primeiro lugar, em função do quadro de incerteza econômica mundial, em que é indispensável que o Brasil mantenha uma realidade fiscal responsável que lhe permita lidar com sucesso com eventuais situações de crise”, escreveu a presidenta, deixando claro que não há acordo e que este aspecto do orçamento poderá ser revisto pelos parlamentares.

Servidores cobraram ministros

O recuou do governo começou a se desenhar já na manhã da quinta-feira (1º), dia seguinte ao envio da proposta de LOA ao Congresso. À tarde, o ministro Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, disse acreditar que o Planalto voltaria atrás ainda esta semana. Foi o que ele relatou ao servidor Antonio Melquiades, o Melqui, diretor da federação nacional (Fenajufe) e do Sintrajud-SP, que levou ao ministro a insatisfação da categoria com o corte dos recursos para o PCS-4 e a expectativa de que o STF respondesse com firmeza ao governo.

A revisão do orçamento com a inclusão dos valores cortados do Judiciário, algo já dado como certo por alguns jornais na noite de quinta-feira (1º), está longe de significar que o governo tenha desistido de impedir a aprovação dos projetos do Judiciário e do MPU, como se observa na mensagem de Dilma. Notícias distribuídas pelas agências “Estado” e “Folha” também afirmam que o Planalto continuará agindo para barrar os reajustes no Congresso.

Marco Aurélio: "De bens intencionados o Brasil está cheio

A reportagem apurou que os ministros do Supremo teriam demonstrado surpresa e irritação com a decisão do governo de mexer no orçamento por eles aprovado. Segundo relatos de membros da direção do Supremo, a comitiva de ministros enviada ao STF para conversar com Peluso, na noite de terça-feira (30), não teria chegado a comunicar ao presidente da mais alta corte do país que o projeto de Lei Orçamentária Anual para 2012 não conteria as previsões para o PCS-4 e nem para o projeto de aumento dos juízes. Os ministros Miriam Belchior (Planejamento), Guido Mantega (Fazenda), José Eduardo Cardoso (Justiça) e Luís Inácio Adams (Advocacia-Geral da União) teriam se limitado a discorrer sobre a crise econômica internacional, as dificuldades orçamentárias observadas pelo governo e a necessidade de o Poder Judiciário contribuir nesse momento. A impressão que teria ficado para os ministros do Supremo, acredita-se que após relatos de Peluso, é de que o governo falava em negociação, não no corte sumário que acabou ocorrendo.

Não há como se confirmar esta versão, já que a reunião com a comitiva ministerial  foi a portas fechadas e só Peluso teria participado pelo STF. Nem o diretor-geral do tribunal, Alcides Diniz, nem o secretário de Recursos Humanos, Amarildo Oliveira Vieira, que costumam acompanhá-lo nestas ocasiões, estiveram na conversa. Outra versão que circulou quase exclusivamente nos veículos ligados às Organizações Globo, menciona que teria ocorrido uma suposta negociação em torno de índices e que Peluso teria concordado com o corte. A reação pública do STF, no entanto, torna isso menos factível. Ou, mesmo na hipótese de que tenha ocorrido, o fato é que a reação do presidente do Supremo, diante da repercussão negativa, fez disso águas passadas.

De todo modo, são fortes os sinais de que de fato os ministros do Supremo se surpreenderam com os cortes e que eles não estavam combinados. Algo que o tribunal optou por tornar público – ao ponto de ministros darem declarações à imprensa e comentários feitos entre eles no intervalo da sessão do STF terem vazado e se disseminado rapidamente em dezenas de órgãos de imprensa, a partir do final da tarde de quinta (1º). “Parece que houve um pequeno equívoco que o Executivo vai retificar, sem dúvida”, disse Peluso. Já o ministro Marco Aurélio Mello foi ainda mais incisivo e descartou classificar o incidente de erro: "De bens intencionados o Brasil está cheio. O que está em jogo não é gasto, é o princípio que implica equilíbrio, que se faz ao mundo jurídico para que não haja supremacia de poderes".

Mobilização pode ser fiel da balança

A reação do STF foi uma vitória dos servidores, que ao longo dos últimos meses batem na tecla de que o ministro Cezar Peluso tem que assumir o seu papel constitucional em defesa da autonomia do Poder Judiciário e do próprio projeto em si. Não parece ter havido um jogo de cartas marcadas, tão comum nesses casos. Isso é uma boa notícia, mas também abre um novo e urgente desafio. Significa que nada está definido e que o papel das mobilizações dos servidores não só segue importante como ganha relevância.

Dois motivos contribuem para essa conclusão: de um lado, o fato de estar claro que o governo deve jogar ainda mais pesado para derrubar o PL 6613/2009; do outro, que a disputa entre o STF e o Planalto agora se tornou pública e ganhou características mais visíveis – sem ilusões de que a qualquer momento, e quanto menos mobilização mais chances disso acontecer, possa ser costurado um acordo por baixo dos panos que não leve em conta os anseios dos servidores.

Paralelo a isso, não se pode descartar o fato de que é mais do que razoável supor que a indignação dos ministros do STF se deva mais ao corte dos recursos para o projeto dos magistrados do que ao conjunto da obra, que inclui o ataque aos servidores. Contra a eventual busca dos juízes por uma saída isolada que apenas os contemple pesa, porém, o desastre que foi o ataque da frente de magistrados e procuradores ao PL 6613, que retardou o envio da proposta ao Congresso em 2009. Dois anos depois, nem servidores nem juízes obtiveram reajuste.

Momento não permite divisão

Dirigentes sindicais do Judiciário e do MPU ouvidos pela reportagem também destacam que, neste momento delicado, manter qualquer clima de divisão dentro da própria categoria será um tiro no pé. Apresentam, para isso, um argumento prático de peso para que aja uma trégua em prol da unidade nacional pela aprovação do PCS-4: é este o projeto defendido pelo STF e que está em disputa no Congresso Nacional. É ainda em torno dele que giram as negociações em curso entre o Executivo e o Judiciário. Não bastasse isso, é a proposta aprovada em todos os fóruns nacionais da categoria, nas assembleias estaduais e que reajusta todos os salários sem mexer em quaisquer direitos – o que é um argumento e tanto a favor da participação de todos numa mesma luta.

Na avaliação de dirigentes sindicais, continuar apostando numa outra proposta agora, como faz a direção da associação do Movimento Pró-Subsídio, é dividir a categoria e, mais do que antes dessa reviravolta orçamentária, joga a favor do inimigo. Ganham importância, nessa conjuntura, as mobilizações da categoria para que a Comissão de Finanças e Tributação aprove o projeto e para que o orçamento seja mantido. O debate sobre a possível retomada da greve, caso a proposta não avance, também está em pauta e deve ser tema das assembleias previstas para acontecer de 15 a 17 de setembro. A preparação para o próximo ato nacional, caravanas em Brasília para acompanhar a sessão da Comissão de Finanças do dia 14, também deve ser reforçada. A luta pelo PCS, avaliam servidores envolvidos nas atividades em Brasília, agora tem que virar uma operação de guerra.


Hélcio Duarte Filho
lutafenajufe